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Document 52020AE5752

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões “Estratégia de mobilidade sustentável e inteligente — pôr os transportes europeus na senda do futuro”» [COM(2020) 789 final]

EESC 2020/05752

JO C 286 de 16.7.2021, p. 158–169 (BG, ES, CS, DA, DE, ET, EL, EN, FR, HR, IT, LV, LT, HU, MT, NL, PL, PT, RO, SK, SL, FI, SV)

16.7.2021   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 286/158


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões “Estratégia de mobilidade sustentável e inteligente — pôr os transportes europeus na senda do futuro”»

[COM(2020) 789 final]

(2021/C 286/27)

Relator:

Stefan BACK

Correlatora:

Tanja BUZEK

Consulta

Comissão Europeia, 26.3.2021

Base jurídica

Artigo 304.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia

Competência

Secção dos Transportes, Energia, Infraestruturas e Sociedade da Informação

Adoção em secção

14.4.2021

Adoção em plenária

27.4.2021

Reunião plenária n.o

560

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

230/1/7

1.   Conclusões e recomendações

1.1

O CESE congratula-se com o facto de a nova estratégia no domínio dos transportes colocar a tónica na mobilidade sustentável e inteligente, realçando o papel fundamental e os benefícios dos transportes para as pessoas e a economia da UE, mas abordando também os custos para a sociedade.

1.2

A estratégia reconhece o papel fundamental do mercado único e das questões sociais na facilitação da transição para uma mobilidade mais sustentável e inteligente, mas não faz jus a esse reconhecimento. Com efeito, as lacunas identificadas no documento de trabalho dos serviços da Comissão que acompanha a comunicação não são satisfatoriamente visadas por medidas nem abordadas em capítulos específicos da estratégia.

1.3

O CESE apoia a abordagem geral adotada de integrar a estratégia no Pacto Ecológico Europeu e de privilegiar ações que visam a realização dos objetivos climáticos. Contudo, põe em dúvida que o equilíbrio entre as medidas técnicas e as medidas de política de transportes seja adequado para alcançar esses objetivos. Salienta, em especial, que muitas das ações propostas em matéria de sustentabilidade e digitalização terão repercussões significativas para o mercado único e os trabalhadores dos transportes. Uma atenção insuficiente a esta questão é suscetível de comprometer o êxito da execução.

1.4

Para ter êxito, a estratégia de mobilidade tem igualmente de ir de par com o reforço da competitividade do setor dos transportes no seu conjunto e da base industrial da UE com ele relacionada.

1.5

A pandemia de COVID-19, sem precedentes, demonstrou a importância crítica do bom funcionamento do mercado único dos transportes e de cadeias de abastecimento sustentáveis, bem como dos transportes públicos para a mobilidade de trabalhadores essenciais. Expôs também o setor dos transportes a uma luta sem tréguas pela sobrevivência, atendendo ao declínio dos volumes de utentes causado pela pandemia.

1.6

A pandemia pôs dramaticamente em evidência a situação de milhares de trabalhadores do setor dos transportes em toda a Europa e em todo o mundo impossibilitados de se deslocar e confrontados, ao mesmo tempo, com contratos de trabalho precários. Chamou igualmente a atenção para a crise social dos transportes, dado que as políticas de transportes das últimas décadas, focalizadas no mercado único, não lograram evitar o agravamento das condições de trabalho em todos os modos de transporte. A este respeito, o CESE considera que se impõe urgentemente aplicar o mesmo nível de ambição a um sistema de transportes socialmente sustentável. Além disso, um plano de contingência para crises no futuro próximo deve procurar evitar efeitos negativos para os trabalhadores dos transportes.

1.7

O CESE saúda o destaque dado na estratégia à participação das mulheres no setor dos transportes, mas, mais uma vez, lamenta a ausência de pontos de ação que traduzam essa ambição.

1.8

O CESE concorda com as prioridades estabelecidas quanto à necessidade de concluir o espaço único europeu dos transportes e reforçar o mercado único, também à luz da experiência da COVID-19, bem como de preparar um plano de emergência de combate à crise. Defende, contudo, que tal plano de emergência deve ser estabelecido com base num diálogo social e com a sociedade civil sério e organizado, e em concertação com os parceiros sociais.

1.9

O CESE considera altamente inadequado limitar os marcos para uma mobilidade resiliente à implementação atempada da RTE-T e à redução do número de mortes causadas pelos transportes, atendendo ao vasto conjunto de tópicos abrangidos nesta secção da estratégia.

1.10

O CESE apoia a intenção de tornar todos os modos de transporte mais sustentáveis e de promover um sistema de transportes multimodal sustentável, com base na cooperação entre os diferentes modos de transporte, bem como em características otimizadas do ponto de vista ambiental e na sustentabilidade social de cada modo. Considera que as emissões dos veículos devem ser medidas ao longo de todo o ciclo de vida do veículo, assim como através do método «do poço à roda».

1.11

O marco 1, que visa que haja em circulação, até 2030, pelo menos 30 milhões de automóveis sem emissões e 80 000 camiões também sem emissões, afigura-se demasiado otimista e deveria ter sido objeto de uma análise mais exaustiva, dado que não existe uma perspetiva clara sobre o número de pontos de carregamento que serão necessários para a quantidade de veículos visada. O CESE adverte contra o estabelecimento de objetivos demasiado ambiciosos, que poderão comprometer a credibilidade da estratégia.

1.12

O CESE tem dúvidas sobre se a nova estratégia é coerente com uma abordagem em que os diferentes modos são encarados como um recurso combinado e em que, no contexto de um sistema de transportes multimodal, é promovida a cooperação entre os modos com base em soluções com a melhor pegada ambiental — e social — e máxima eficiência.

1.13

O dumping social e as práticas desleais num setor geram distorções noutros setores. As condições de trabalho precárias e a falta de fiscalização do cumprimento da legislação social distorcem os sinais para a fixação de preços e as escolhas relativas aos serviços de transporte. O CESE considera que é necessário levar a cabo uma iniciativa tendente a integrar os custos laborais como componente de uma política justa de fixação dos preços de serviços de transportes sustentáveis, além da internalização de todos os custos externos. Uma fixação de preços justa, no mercado livre, para serviços de transporte tem de incluir um salário digno, uma remuneração igual por trabalho igual realizado no mesmo local, bem como cobertura em matéria de cuidados de saúde e de segurança social. Existe, no que se refere à fixação de preços para os transportes públicos, uma compensação para obrigações de serviço.

1.14

A estratégia prevê que em 2030 os transportes marítimo e ferroviário sejam capazes de concorrer em pé de igualdade com o transporte rodoviário, mas não explica de que forma isso será conseguido. Com efeito, falta uma estratégia mais abrangente para impulsionar o transporte ferroviário de mercadorias e o transporte marítimo de curta distância.

1.15

Os auxílios estatais são importantes para promover objetivos políticos, tais como a ecologização e a promoção da dimensão social dos transportes. O CESE considera que é urgente rever as orientações relativas aos auxílios estatais, em particular as orientações relativas aos auxílios estatais no domínio do transporte marítimo, a fim de assegurar condições sociais e económicas justas no setor portuário e o emprego dos marítimos europeus.

1.16

Além disso, a estratégia carece de uma análise aprofundada da ligação crucial entre o mercado único e a política de concorrência e o CESE partilha das reservas em torno da prorrogação da vigência do regulamento de isenção por categoria relativo aos consórcios.

1.17

A estratégia também não tem devidamente em conta os anseios das zonas rurais. O CESE solicita que a futura Comunicação sobre uma visão a longo prazo para as zonas rurais examine o aspeto crucial da mobilidade e assegure alternativas viáveis adequadas e acessíveis a todos.

1.18

Para evitar a pobreza nos transportes, o acesso a transportes públicos de qualidade a preços acessíveis é fundamental, enquanto alternativa sustentável aos modos de transporte individuais, e assume especial relevância nas zonas rurais. No processo de transição para uma mobilidade urbana sustentável, deve ser dada mais ênfase ao transporte público enquanto espinha dorsal dessa transição e fonte importante de inclusão social e de emprego local de qualidade.

1.19

O CESE considera que cumpre realizar os projetos-piloto em matéria de mobilidade cooperativa, conectada e automatizada no âmbito do tráfego urbano. Esses projetos devem ter por base uma avaliação de impacto na segurança, bem como o diálogo social e com a sociedade civil. Destaca a necessidade de financiamento adequado para permitir o reforço das competências sempre que necessário.

1.20

No que respeita à mobilidade urbana, as plataformas da mobilidade enquanto serviço («Mobility as a Service» — MaaS) devem estar sob responsabilidade pública a fim de garantir a execução dos planos de mobilidade urbana sustentável (PMUS). Apenas os fornecedores de serviços de mobilidade socialmente responsáveis que proporcionam condições de trabalho justas e dignas devem ter acesso às plataformas MaaS, tendo em conta, nomeadamente, a legislação prevista em matéria de trabalhadores das plataformas.

1.21

O CESE aplaude os objetivos de digitalização e de automatização estabelecidos na estratégia, como meio de alcançar os objetivos de sustentabilidade, e apela para um diálogo alargado sobre os impactos mais vastos na sociedade e no meio ambiente. Salienta a necessidade de adotar uma abordagem centrada nas pessoas, que incorpore aspetos sociais e ambientais.

1.22

O CESE constata com preocupação que o capítulo sobre mobilidade inteligente não propõe quaisquer medidas relativamente aos trabalhadores dos transportes. A consideração do fator humano na investigação, conceção e implantação de tecnologias digitais e de automatização é fundamental para a utilização com êxito de tais inovações e deve assentar num diálogo social inclusivo para assegurar uma transição justa.

1.23

A transição digital já está em curso. O CESE lamenta que até 2023 não sejam formuladas recomendações sobre o impacto da transição na força de trabalho do setor dos transportes. Solicita a adoção imediata de medidas, em concertação com os parceiros sociais, com base nas boas práticas existentes.

1.24

O êxito dos investimentos nas tecnologias digitais passa por um diálogo social participativo desde uma fase inicial que inclua um debate sobre a finalidade da digitalização e da automatização (por exemplo, aumento da eficiência versus sobrecapacidade) e o objetivo das medidas correspondentes para promover locais de trabalho mais seguros e saudáveis, para salvaguardar o emprego e para assegurar que os trabalhadores recebem uma parcela justa dos ganhos de produtividade.

1.25

O CESE congratula-se com o maior reconhecimento do papel dos trabalhadores dos transportes, mas considera que são necessárias iniciativas legislativas concretas para erradicar o dumping social em todos os modos de transporte. Defende a urgência de criar um grupo de trabalho para as questões sociais no setor dos transportes, incluindo todas as Direções-Gerais (DG) pertinentes, tais como a DG MOVE, a DG EMPL e outras.

1.26

O CESE apoia o objetivo de zero vítimas mortais resultantes da mobilidade em todos os modos de transporte até 2050, mas a estratégia não oferece respostas para os problemas do transporte rodoviário, nomeadamente para o problema da fadiga dos motoristas como «doença crónica» e como fator importante na origem dos acidentes. No caso concreto dos condutores de autocarros, chama a atenção para o relatório que a Comissão Europeia apresentará ao Conselho e ao Parlamento, e espera que as instituições da UE ajam em conformidade com os objetivos políticos estabelecidos no Regulamento relativo aos tempos de condução e de repouso.

1.27

O CESE sublinha a importância da obtenção de um amplo apoio das partes interessadas da sociedade civil, incluindo dos parceiros sociais, para uma transição ecológica, social e digital, e manifesta a sua disponibilidade para contribuir para um diálogo com a sociedade civil tendo em vista a definição e a execução da estratégia. A Comissão afirma acertadamente na estratégia que a transição para uma mobilidade sustentável, inteligente e resiliente deve ser justa, porque senão pode não ser exequível.

2.   Contexto

2.1

A Estratégia de mobilidade sustentável e inteligente — pôr os transportes europeus na senda do futuro realça o papel vital e os benefícios dos transportes para as pessoas e a economia da UE, mas também aborda os custos para a sociedade. Na comunicação, a Comissão propõe uma nova estratégia para alcançar os objetivos, acordados no Pacto Ecológico Europeu, de redução das emissões de gases com efeito de estufa provenientes dos transportes em 55 % até 2030 e em 90 % até 2050. Além disso, estabelece um roteiro para a digitalização e o desenvolvimento da automatização e da inteligência artificial (IA) no setor dos transportes.

2.2

À luz da experiência da crise da COVID-19, a estratégia privilegia a resiliência face a crises futuras como objetivo fundamental da política de transportes da UE, a par da conclusão do espaço único europeu dos transportes, em conformidade com o Livro Branco de 2011 sobre a política de transportes.

2.3

Na estratégia, que introduz dez domínios de ação (iniciativas emblemáticas) e 14 marcos concretos, a Comissão defende também que a mobilidade a preços acessíveis deve estar disponível para todos e que o setor tem de oferecer boas condições sociais, oportunidades de requalificação e emprego atrativo. O Pilar Europeu dos Direitos Sociais deve ser o garante de uma transição ecológica e digital justa.

2.4

O plano de ação anexo à comunicação estabelece 82 ações a executar entre 2021 e 2023. É fornecida uma análise mais aprofundada num documento de trabalho dos serviços da Comissão que acompanha a comunicação.

3.   Observações gerais: A visão da estratégia

3.1

Uma década após o último livro branco sobre a política de transportes, em 2011, a nova estratégia global visa alcançar os objetivos fundamentais da mobilidade sustentável, inteligente e resiliente. Os livros brancos anteriores (1992, 2001 e 2011) colocaram, todos eles, uma forte ênfase no estabelecimento do espaço único europeu dos transportes e na realização do mercado único.

3.2

Já em 2001 e 2011, os livros brancos abordavam o problema da dependência da UE em relação aos combustíveis fósseis e o problema das alterações climáticas, bem como da crescente contribuição do setor dos transportes da UE para as emissões de gases com efeito de estufa, não tendo, contudo, atingido os respetivos objetivos em matéria de clima. Devido à crise climática, o CESE saúda vivamente a abordagem adotada de integrar a nova estratégia da UE para a mobilidade no Pacto Ecológico Europeu e de privilegiar medidas tendentes a alcançar os objetivos climáticos.

3.3

Para ser coroada de êxito, a estratégia de mobilidade deve ir de par com o reforço da base industrial da UE, a fim de assegurar que as cadeias de valor industriais europeias conexas constituirão a espinha dorsal de uma transformação sustentável e digital dos transportes europeus. A estratégia deve assentar firmemente no reforço da competitividade do setor dos transportes no seu conjunto.

3.4

A pandemia de COVID-19, sem precedentes, demonstrou a importância crítica do bom funcionamento do mercado único dos transportes e de cadeias de abastecimento sustentáveis, tendo também exposto o setor dos transportes a uma luta sem tréguas pela sobrevivência, atendendo ao declínio dos volumes de utentes causado pela pandemia. Pôs dramaticamente em evidência a situação de milhares de trabalhadores do setor dos transportes em toda a Europa e em todo o mundo impossibilitados de se deslocar e confrontados, ao mesmo tempo, com contratos de trabalho precários, uma proteção social e uma cobertura para cuidados de saúde insuficientes, e a perda do emprego sem direito a proteção social. Esta situação chama igualmente a atenção para a crise social no setor dos transportes, que revela omissões nas políticas de transportes da UE passadas e demonstra a necessidade de aplicar o mesmo nível de ambição ao desenvolvimento de um sistema de transportes socialmente sustentável. O CESE considera fundamental não desperdiçar a oportunidade de definir um Espaço Único Europeu dos Transportes verdadeiramente sustentável para o futuro que necessita agora de correções de fundo para avançar. Além disso, um futuro plano de emergência deve procurar evitar efeitos negativos para os trabalhadores dos transportes.

3.5

Apesar das iniciativas tomadas até à data, o Espaço Único Europeu dos Transportes, incluindo as dimensões do mercado único, social e ambiental, não foi concretizado e requer a adoção urgente de mais medidas. O CESE lamenta que a estratégia, embora desenvolva com grande pormenor os objetivos climáticos e de digitalização e os meios para os alcançar, seja menos exaustiva no que respeita ao mercado único e às questões sociais. Esse facto é tanto mais lamentável quanto muitas das ações propostas relacionadas com a sustentabilidade e a digitalização têm amplos efeitos sobre o mercado único e a situação dos trabalhadores do setor dos transportes, e essa correlação é constantemente referida ao longo do parecer. A este respeito, o CESE solicita uma abordagem mais holística e transversal para evitar que a estratégia conduza a uma vitória pírrica.

3.6

O CESE congratula-se com o facto de a estratégia destacar a importância da participação das mulheres no setor dos transportes e com o compromisso da Comissão de aplicar «devidamente a integração da igualdade nas suas iniciativas políticas relacionadas com os transportes», mas lamenta a ausência de pontos de ação à altura dessa ambição. O «intercâmbio de boas práticas» e a criação de uma rede de embaixadores para a diversidade não são suficientes para promover a integração da abordagem sensível ao género nas políticas da UE para os transportes. O guia de tópicos dos planos de mobilidade urbana sustentável (PMUS) intitulado «Addressing Gender Equity and Vulnerable Groups in SUMPs» [Abordar a igualdade entre os géneros e os grupos vulneráveis nos PMUS] contém bons exemplos de pontos de ação.

3.7

A maioria das ações previstas nas secções 1 a 3 da estratégia (visão, mobilidade sustentável e mobilidade inteligente) tem um âmbito restrito limitado a questões essencialmente técnicas relacionadas com as características ambientais dos veículos, navios e aeronaves, a implantação de infraestruturas para combustíveis alternativos, projetos de desenvolvimento industrial e digital, a tributação da energia e a internalização dos custos externos com o objetivo de aplicar os princípios do «poluidor-pagador» e do «utilizador-pagador». As iniciativas emblemáticas 3 e 4 dizem respeito a medidas políticas legislativas e não legislativas para promover o transporte sustentável de passageiros e de mercadorias.

3.8

Embora as medidas e os marcos propostos se afigurem bastante coerentes, em termos recíprocos, no que se refere às questões essencialmente técnicas tratadas nas secções 1 a 3, o CESE tem dúvidas sobre se o equilíbrio entre medidas técnicas e medidas de política de transportes é adequado para alcançar os objetivos climáticos.

3.9

O CESE também questiona a abordagem, que torna necessário um documento de trabalho dos serviços da Comissão de quase 300 páginas para a plena compreensão dos objetivos da estratégia. Esta forma de apresentação e de explicação não a torna acessível ou suscetível de ganhar facilmente um amplo apoio.

3.10

Na estratégia, a Comissão afirma, com razão, que «o ativo mais valioso do setor é, de longe, constituído pelas pessoas que o compõem, e a transição sustentável e inteligente não será possível sem o apoio e a adesão dos trabalhadores dos transportes».

3.11

O CESE chama a atenção para a preocupação específica das zonas rurais europeias de que as metas de mobilidade sustentável só possam ser alcançadas mediante enormes concessões em termos de estilo de vida. Apela desde já à Comissão para que examine, na sua futura Comunicação sobre uma visão a longo prazo para as zonas rurais, o aspeto crucial da mobilidade e assegure alternativas viáveis adequadas e acessíveis a todos.

3.12

O CESE sublinha a importância da obtenção de um apoio alargado entre as partes interessadas da sociedade civil, incluindo os parceiros sociais, para a transição ecológica e digital visada. Isto significa também que a dimensão social, incluindo um diálogo sobre a melhor forma de gerir a transição e torná-la socialmente aceitável, assume uma importância capital.

3.13

O CESE está disposto a contribuir para o diálogo com a sociedade civil para efeitos da definição e da execução da estratégia e o presente parecer visa contribuir com propostas concretas para o debate.

4.   Mobilidade sustentável

4.1

O CESE concorda que para alcançar a mudança sistémica visada são necessários três pilares de ações, a saber: «1) tornar todos os modos de transporte mais sustentáveis, 2) tornar amplamente disponíveis alternativas sustentáveis num sistema de transportes multimodal e 3) criar os incentivos adequados para impulsionar a transição».

4.2

Para tornar todos os transportes mais sustentáveis, o marco 1 visa o objetivo, a atingir até 2030, de 30 milhões de automóveis sem emissões e 80 000 camiões sem emissões em circulação, face a valores atuais de cerca de um milhão de automóveis e 30 000 camiões sem emissões (1). O CESE toma nota da convicção de que as decisões de investimento relativas aos veículos em utilização até 2030 serão tomadas agora ou a breve prazo. Atendendo à diferença de preços, ao facto de a infraestrutura de carregamento/reabastecimento de combustíveis alternativos estar ainda pouco desenvolvida, e ao tempo de vida dos veículos, esse cenário afigura-se excessivamente otimista. Acresce que parece não haver ainda uma ideia clara do número de pontos de carregamento/reabastecimento de combustível que serão necessários para dar suporte ao número de veículos visado. O CESE adverte contra o estabelecimento de objetivos demasiado ambiciosos, que poderão comprometer a credibilidade da estratégia.

4.3

A estratégia define claramente a eletricidade e o hidrogénio como opção prioritária para descarbonizar a mobilidade. Uma abordagem rigorosa da mobilidade com emissões nulas deve ter em conta a pegada de carbono dos veículos ao longo de todo o seu ciclo de vida (em 2018, apenas 33 % da eletricidade na UE foi produzida a partir de energias renováveis) e ser medida através do método «do poço à roda».

4.4

O CESE apoia firmemente a transição para soluções de transporte mais sustentáveis e incentiva a Comissão a desenvolver esta abordagem com linhas de ação concretas que apoiem também os transportes não motorizados.

4.5

O Pacto Ecológico dá prioridade à eficiência na utilização dos recursos, mediante a transição para uma economia limpa e circular e restaurando a biodiversidade, pondo termo à degradação dos espaços públicos e reduzindo a poluição. Tendo em conta o que precede, o CESE reitera que uma estratégia de transporte sustentável tem de dar prioridade ao uso do solo para poupar infraestruturas e assegurar uma parcela de espaço justa nas cidades e aglomerados e uma utilização eficiente dos recursos, nomeadamente de recursos críticos. Os direitos fundamentais têm de ser respeitados.

4.6

O CESE congratula-se com o facto de a Comissão Europeia continuar a dialogar com os órgãos de poder local e os Estados-Membros para garantir que todas as cidades de grande e média dimensão implementem os seus próprios planos de mobilidade urbana sustentável (PMUS) até 2030. A situação atual parece indicar que o aumento desejado do número de PMUS elaborados não se verificará sem o estabelecimento dos quadros nacionais e dos instrumentos financeiros necessários ao desenvolvimento e execução dos PMUS.

4.7

A estratégia refere-se apenas sucintamente à gestão e às políticas de estacionamento. O CESE recomenda que se continue a desenvolver este aspeto com linhas de ação claras, tendo em conta o impacto negativo das áreas de estacionamento na impermeabilização dos solos nas cidades. Uma boa gestão do estacionamento pode contribuir para libertar espaço público valioso, tornar as cidades mais atrativas, apoiar a economia local, reduzir o tráfego automóvel e melhorar o congestionamento, a segurança rodoviária e a poluição atmosférica.

4.8

O segundo pilar do transporte sustentável diz respeito à disponibilidade de modos de transporte alternativos e oferece para esse fim uma escolha modal no âmbito de uma abordagem multimodal. Os marcos 4 e 8 fixam objetivos a atingir até 2030 e 2050, para um aumento maciço do transporte ferroviário de passageiros (duplicando o tráfego ferroviário de alta velocidade até 2030 e triplicando-o até 2050) e do transporte ferroviário de mercadorias (aumento de 50 % até 2030 e duplicação até 2050). Além disso, são estabelecidas metas em relação às viagens coletivas programadas, ao transporte por vias navegáveis interiores e ao transporte marítimo de curta distância, bem como o objetivo de que haja, até 2030, pelo menos 100 cidades com um impacto neutro no clima na Europa.

4.9

O CESE tem dúvidas sobre se a estratégia é coerente com uma abordagem em que os diferentes modos são encarados como um recurso combinado e, no contexto de um sistema de transportes multimodal, é promovida a cooperação entre os modos, em vez da concorrência entre estes, com base em soluções com o menor impacto ambiental — e social — e a maior eficiência possíveis.

4.10

Neste contexto, o CESE apela para a realização de uma avaliação da sustentabilidade mais abrangente a fim de incorporar plenamente a sustentabilidade social. Propõe complementar a pegada ambiental prevista na estratégia com a introdução de uma «pegada laboral europeia do transporte» equiparável, com condições de trabalho justas, incluindo todos os elementos para prevenir a contínua deterioração, assegurar a concorrência leal entre os operadores de cada modo de transporte e entre os diferentes modos de transporte e evitar uma concorrência destrutiva com a criação de incentivos indevidos. A fim de assegurar condições de concorrência equitativas entre os modos de transporte, a fixação de preços justa no mercado livre tem de incluir custos laborais justos, como é sublinhado no capítulo 6.

4.11

O CESE lamenta que o desenvolvimento de modelos multimodais de transporte de mercadorias, com base na cooperação entre os modos, em características ambientais otimizadas e na sustentabilidade social de cada modo, otimizando os recursos através de plataformas digitais no pleno respeito da legislação social, não seja um dos marcos a alcançar no âmbito do pilar da mobilidade inteligente da estratégia.

4.12

O marco 9 antecipa que os transportes marítimo e ferroviário possam competir em igualdade de circunstâncias com o transporte rodoviário em 2030, sem explicar de que forma se alcançará esse objetivo, exceto, possivelmente, através da internalização dos custos externos e da tributação dos combustíveis. Falta, com efeito, uma estratégia mais abrangente para impulsionar o transporte ferroviário de mercadorias e o transporte marítimo de curta distância, que tenha em conta, entre outros aspetos, o custo mais elevado e os problemas de pontualidade do transporte ferroviário descritos no documento de trabalho dos serviços da Comissão.

4.13

O objetivo do marco 4 é que, até 2030, todas as viagens programadas de menos de 500 km dentro da UE sejam neutras em termos de carbono. O impacto no transporte de passageiros por autocarro e os possíveis efeitos negativos sobre a sustentabilidade têm de ser discutidos.

4.14

Os auxílios estatais são importantes para promover objetivos políticos, tais como a ecologização e a promoção da dimensão social dos transportes. O CESE considera que é urgente rever as orientações relativas aos auxílios estatais. Os aspetos territoriais, por exemplo em relação às regiões remotas, são um dos elementos que necessitam de ser revistos. Além disso, chama a atenção para o facto de que a revisão das orientações relativas aos auxílios estatais para o transporte marítimo a fim de assegurar condições sociais e económicas justas no setor portuário e o emprego dos marítimos europeus é um pedido que não é de agora e que urge satisfazer para tornar o setor do transporte marítimo socialmente sustentável, tal como o apelo a uma ação mais célere, antes de 2023.

4.15

O CESE critica a ausência, na estratégia, de uma análise exaustiva da ligação crucial entre o mercado único e a política de concorrência. Concorda com a necessidade de um debate sólido sobre os auxílios estatais e os subsídios ao transporte marítimo, e os seus efeitos no setor portuário. Os parceiros sociais europeus expressaram em conjunto a sua preocupação em relação à prorrogação do regulamento de isenção por categoria aplicável aos consórcios que, segundo eles, irá agravar a desigualdade de tratamento entre os armadores e as partes interessadas dos portos e terá efeitos negativos no setor portuário da UE (2).

5.   Mobilidade inteligente

5.1

O CESE concorda que com a inovação a moldar «a mobilidade dos passageiros e da carga no futuro, devem ser implantados o quadro e os facilitadores adequados, a fim de facilitar esta transição, que pode tornar o sistema de transportes muito mais eficiente e sustentável». Considera imperativo seguir um princípio orientador fundamental: a digitalização e a automatização são instrumentos e não um objetivo em si mesmas.

5.2

Neste contexto, o CESE aplaude os objetivos em matéria de digitalização e de automatização estabelecidos na estratégia, enquanto meio de alcançar os objetivos de sustentabilidade. A abordagem do impacto da IA na sociedade e no meio ambiente, e de questões como o princípio do controlo humano sobre a máquina, bem como a recolha de dados pessoais e o uso dado a esses dados, reveste-se da máxima importância e requer um diálogo alargado. A inclusão do fator humano na investigação, conceção e implantação de tecnologias digitais e de automatização é essencial para a utilização com êxito de tais inovações e deve basear-se num diálogo social inclusivo com vista a assegurar uma transição justa. É necessária uma abordagem centrada nas pessoas, que incorpore aspetos sociais e ambientais, bem como uma garantia de que as tecnologias não serão utilizadas de forma abusiva.

5.3

O CESE chama a atenção para o facto de a estratégia não fazer qualquer referência às iniciativas horizontais relativas a aspetos de segurança, responsabilidade, direitos fundamentais e dados da IA e ao pacote legislativo sobre dados relativo ao controlo e às condições da partilha de dados.

5.4

Para que a UE se torne líder mundial no desenvolvimento de serviços e sistemas de mobilidade cooperativa, conectada e automatizada, importa facilitar os testes de serviços-piloto nos sistemas de tráfego urbano, com base numa avaliação de impacto na segurança, bem como no diálogo social e com a sociedade civil. Os atuais projetos-piloto são testados principalmente em sistemas de transporte fechados (campus, complexos industriais, etc.).

5.5

O CESE congratula-se com o facto de a estratégia abordar a transformação digital na mobilidade urbana, incluindo a MaaS, os serviços partilhados, os serviços a pedido e a emergência de plataformas intermediárias, e as oportunidades de desenvolvimento de conceitos de transporte eficiente e sustentável, bem como os riscos associados, que tal transformação proporciona. Além disso, aplaude o facto de a Comissão, no ponto 38, procurar, acertadamente, dar resposta a preocupações sociais e relacionadas com a segurança, dado que vários serviços de mobilidade e plataformas intermediárias novas oferecem formas de emprego precárias e salários baixos, o que pode levantar problemas de concorrência. No entanto, a ação 23, que consiste em «avaliar a necessidade de medidas para garantir condições de concorrência equitativas para as plataformas de transporte de passageiros e de veículos de aluguer com condutor locais e a pedido», só está prevista para 2022.

5.6

As plataformas MaaS deverão estar sob controlo público a fim de garantir a execução dos PMUS. Apenas os fornecedores de serviços de mobilidade socialmente responsáveis que proporcionam condições de trabalho justas e dignas devem ter acesso às plataformas MaaS, tendo em conta, nomeadamente, a legislação prevista em matéria de trabalhadores das plataformas.

5.7

O CESE acolhe com satisfação a iniciativa da Comissão relativa à adoção de legislação para regulamentar as condições de trabalho dos trabalhadores das plataformas e espera que a proposta assegure a presunção de um vínculo laboral e condições de trabalho justas para os trabalhadores das plataformas no setor dos transportes, nomeadamente dos serviços de veículos de aluguer com condutor ou de entrega.

5.8

O CESE tem presente que o custo das soluções de mobilidade inteligente, o desenvolvimento da IA e a automatização podem potencialmente agravar as disparidades, dado que o cenário de base para esse desenvolvimento varia de Estado-Membro para Estado-Membro, e está muito atento ao problema. Por conseguinte, considera fundamental para o êxito de qualquer estratégia que a UE combata estas disparidades de investimento, reforçando as soluções de mobilidade inteligente nos Estados-Membros mais pobres, mas também impondo o diálogo social, condições sociais e uma abordagem centrada no ser humano.

6.   Mobilidade resiliente

6.1

A secção 4 sobre a mobilidade resiliente enuncia três iniciativas emblemáticas — reforçar o mercado único, tornar a mobilidade justa e equitativa para todos e aumentar a segurança intrínseca e extrínseca dos transportes, acompanhadas dos marcos 13 e 14.

Relevância do mercado único

6.2

O CESE concorda com as prioridades estabelecidas no que respeita à necessidade de concluir o Espaço Único Europeu dos Transportes e de reforçar o mercado único, nomeadamente à luz da experiência da crise da COVID-19, bem como à necessidade de preparar um plano de emergência de combate à crise. Entende, contudo, que tal plano de emergência deve ser estabelecido com base num diálogo social e com a sociedade civil sério e organizado, e em concertação com os parceiros sociais.

6.3

O CESE lamenta, no entanto, que, designadamente, a conclusão do espaço único europeu dos transportes e o reforço do mercado único, a importância da implementação atempada da RTE-T e o desenvolvimento de cadeias de valor estratégicas, em relação, por exemplo, às baterias e ao hidrogénio e as necessidades financeiras associadas para realizar os objetivos do Pacto Ecológico e a transição digital nos transportes sejam agrupadas com temas importantes como os direitos dos passageiros, as obrigações de serviço público (OSP), as condições sociais dos trabalhadores dos transportes e a segurança intrínseca e extrínseca dos transportes. Causa estranheza que as questões globais do mercado único e as questões sociais e de segurança relacionadas surjam em último lugar na estratégia.

6.4

O CESE entende que limitar os marcos desta secção à implementação atempada da RTE-T e à redução do número de mortes causadas pelos transportes é altamente inadequado, uma vez que a secção trata do reforço do mercado único e da conclusão do espaço único europeu dos transportes, incluindo o aumento da eficiência através da facilitação de uma utilização ótima das capacidades, o financiamento da modernização das frotas, questões relativas aos auxílios estatais, a melhoria da conectividade e a proteção dos passageiros e dos seus direitos.

6.5

O CESE regista a visão defendida na estratégia de que um mercado único que funcione bem e seja resiliente às crises deve constituir igualmente um objetivo fundamental da política de transportes da UE e que «tornar a mobilidade mais ecológica deve constituir a nova viabilidade que permita ao setor dos transportes crescer». Por exemplo, o CESE considera que a conclusão do mercado único dos transportes com novos modelos de negócio sustentáveis e digitais deveria figurar entre os marcos.

6.6

Lamenta também que a estratégia não descreva os obstáculos à plena realização do mercado único no setor dos transportes que ainda subsistem. Nomeadamente na secção 4.3.3 do documento de trabalho dos serviços da Comissão são referidos vários problemas relativos ao funcionamento do mercado único que não são abordados na secção 4. O mesmo acontece com as várias lacunas sociais descritas na secção 4.3.4, que não são contempladas na estratégia.

6.7

Os processos no âmbito do programa Legislar Melhor necessitam de ser melhorados. O CESE insiste em que para cada uma das ações, quer sejam mencionadas no plano de ação ou noutros documentos, deve ser realizada uma avaliação de impacto exaustiva (do ponto de vista social, ambiental, económico, com integração da perspetiva de género) com consulta privilegiada dos parceiros sociais reconhecidos, tais como as organizações representativas aprovadas pela Comissão.

6.8

Do mesmo modo, várias das ações previstas em secções anteriores da estratégia têm claras repercussões no mercado interno, nomeadamente as alterações à Diretiva relativa aos pesos e dimensões dos veículos de mercadorias e as alterações à legislação no setor da aviação ou no que se refere às plataformas digitais.

Dimensão social e condições de trabalho

6.9

A crise sem precedentes causada pela pandemia de COVID-19 demonstrou que o transporte é um serviço essencial. Além disso, realçou a importância dos trabalhadores dos transportes como trabalhadores fundamentais e a sua relevância para a resiliência do sistema de transportes. O CESE congratula-se com o maior reconhecimento dado na estratégia aos trabalhadores dos transportes em comparação com documentos de política de transportes anteriores, nomeadamente reconhecendo que são «o ativo mais valioso do setor» e que alguns sofrem condições de trabalho difíceis e precárias. No entanto, tendo em conta a importância atribuída ao pilar social na presente aplicação das políticas da UE, é surpreendente que a dimensão social dos transportes não seja abordada numa secção específica.

6.10

A estratégia reconhece também os problemas demográficos do setor e as dificuldades em atrair os trabalhadores de que este necessita. Constata que «assegurar padrões sociais mais elevados contribuiria diretamente para inverter a atual falta geral de atratividade do setor». Lamentavelmente, nem a estratégia nem o documento de trabalho dos serviços da Comissão analisam de forma adequada as causas subjacentes às dificuldades sentidas pelo setor dos transportes na captação de trabalhadores. Estes documentos não têm em conta o facto de que as políticas de transportes das últimas décadas com enfoque no mercado único não lograram evitar o agravamento das condições de trabalho em todos os modos de transporte.

6.11

As afirmações da Comissão de que irá «ponderar a adoção de medidas nos diferentes modos de transporte para reforçar o quadro legislativo em matéria de condições para os trabalhadores» e lançar iniciativas para aumentar a atratividade do setor no período 2021-2023 são demasiado vagas. Com efeito, o CESE não compreende por que razão aspetos como a promoção de condições de trabalho justas e o aumento da atratividade da profissão, incluindo para os jovens e para as mulheres, não foram considerados merecedores do estabelecimento de marcos.

6.12

São necessárias iniciativas legislativas concretas para erradicar o dumping social em todos os modos de transporte. O princípio da igualdade de remuneração por trabalho igual no mesmo local deve aplicar-se a todos os modos de transporte (destacamento de trabalhadores com elevada mobilidade) ou ser garantida a proteção do emprego e dos direitos adquiridos para trabalhadores sujeitos a uma mudança de operadores em virtude da adjudicação de contratos relativamente aos diferentes modos de transporte. Por conseguinte, o CESE defende que é urgente criar um grupo de trabalho para as questões sociais no setor dos transportes, que inclua todas as DG pertinentes, tais como a DG MOVE, a DG EMPL e a DG Concorrência.

Custos sociais e sustentabilidade

6.13

O dumping social e as práticas desleais num setor geram distorções noutros setores. As condições de trabalho precárias e a falta de fiscalização do cumprimento da legislação social distorcem os sinais para a fixação de preços e as escolhas relativas aos modos de transporte. O CESE considera que é necessário levar a cabo uma iniciativa tendente a integrar os custos laborais como componente de uma política justa de fixação dos preços de serviços de transportes sustentáveis, além da internalização de todos os custos externos. Uma fixação de preços justa, no mercado livre, para serviços de transporte tem de incluir um salário digno, uma remuneração igual por trabalho igual realizado no mesmo local, bem como cobertura em matéria de cuidados de saúde e segurança social e investimentos num local de trabalho saudável e nas qualificações e formação. O aditamento de uma «pegada laboral» às recomendações relativas à pegada de carbono nas ações 28 e 34, conforme referido no ponto 4.6, é uma medida a ponderar, embora esteja longe de ser suficiente. Existe, no que se refere à fixação de preços para os transportes públicos, uma compensação para obrigações de serviço.

6.14

O CESE sublinha a importância da negociação coletiva e o papel da mesma na fixação dos níveis salariais e insiste, por isso, na importância do reforço da negociação coletiva, em particular no setor dos transportes, fortemente fragmentado, e em todos os Estados-Membros.

Transição digital justa

6.15

O CESE congratula-se com o facto de a estratégia contemplar de forma adequada os riscos e as oportunidades da transformação digital para o emprego e a necessidade de uma transição justa para os trabalhadores dos transportes. No entanto, a ação 69, ou seja, a «formulação de recomendações para a transição para a automatização e a digitalização e seu impacto na força laboral do setor», só está prevista para 2023. Tal não tem em conta o facto de que a digitalização e a automatização já estão em curso e é necessária uma ação urgente. O marco 13, por exemplo, estabelece o objetivo de implantação da mobilidade automatizada em larga escala até 2030.

6.16

O êxito dos investimentos nas tecnologias digitais assenta num diálogo social participativo desde o início. Existem exemplos de boas práticas, como a convenção coletiva de trabalho CBA Future — Shaping automation socially and in a co-determined way [CCT Futuro — Definir a automatização numa base social e de forma codeterminada] do operador de terminais de contentores EUROGATE, na Alemanha, que abrange os três terminais da empresa em Hamburgo, Bremerhaven e Wilhelmshaven (3). Este diálogo deve incluir também um debate sobre a finalidade da digitalização e da automatização (por exemplo, aumento da eficiência versus sobrecapacidade), o objetivo das medidas correspondentes para promover locais de trabalho mais seguros e saudáveis, para salvaguardar o emprego e para assegurar que os trabalhadores recebem uma parcela justa dos ganhos de produtividade.

6.17

A nível europeu, os parceiros sociais europeus no domínio dos transportes públicos urbanos subscreveram recentemente recomendações conjuntas sobre a transformação digital nos transportes públicos urbanos (4). Essas recomendações promovem uma abordagem inclusiva e participativa da transformação digital, com vista a garantir a segurança do emprego e assegurar as competências no âmbito da transformação digital, utilizando essa mesma transformação para melhorar as condições de trabalho e o equilíbrio entre a vida profissional e a vida privada e garantindo a proteção dos dados, da vida privada e a dignidade. As estratégias devem garantir que tanto as empresas como os trabalhadores beneficiam da implementação das tecnologias digitais, nomeadamente através da repartição dos ganhos de produtividade.

6.18

A Comissão, em concertação com os parceiros sociais, deve adotar imediatamente medidas para garantir uma transição justa para a automatização e a digitalização «que não deixe ninguém para trás».

Segurança intrínseca e extrínseca dos transportes

6.19

Quanto ao tema da segurança dos transportes, o marco 14 visa uma taxa de mortalidade de quase zero para todos os modos de transporte até 2050, sendo que a mortalidade no transporte rodoviário constitui a principal preocupação. A estratégia de segurança rodoviária da UE de 2018, contudo, não contempla o transporte rodoviário profissional e, em particular, o problema da fadiga dos motoristas como «doença crónica» e como um importante fator na origem dos acidentes.

6.20

Neste contexto, o CESE exprime sérias reservas quanto à nova iniciativa da Comissão relativa às regras em matéria de tempos de condução e repouso para condutores de autocarros, chamando a atenção para o relatório que a Comissão apresentará ao Conselho e ao Parlamento. Um eventual prolongamento das horas de trabalho e de condução no setor seria contrário aos objetivos políticos do Regulamento (CE) n.o 561/2006 (5) e conduziria a uma deterioração acrescida das condições de segurança rodoviária para passageiros e outros utentes rodoviários, bem como das condições de trabalho dos condutores de autocarros.

6.21

O CESE apoia as medidas previstas para melhorar a segurança, aprovando, em particular, o facto de serem previstas medidas para lidar com as ciberameaças.

7.   Importância de um serviço público forte

7.1

O CESE reitera que é uma tarefa de política pública garantir a existência de um sistema de transportes urbano sustentável que assegure o cumprimento dos objetivos climáticos mas também a saúde pública, a segurança rodoviária intrínseca e extrínseca e a utilização do espaço urbano na justa proporção.

7.2

Na sua visão, a Comissão Europeia salienta, acertadamente, que é «crucial que a mobilidade esteja disponível e a preços acessíveis a todos, que as regiões rurais e periféricas estejam conectadas». O CESE insiste em que a disponibilidade de serviços públicos, apoiada pelo quadro jurídico, é a espinha dorsal de uma mobilidade sustentável e a custos acessíveis. Tal requer a compensação do cumprimento de obrigações de serviço público adicionais e mais positivas em termos ambientais e sociais através da concessão de apoio financeiro e da introdução de instrumentos financeiros pelos governos e órgãos de poder regional e local nacionais.

7.3

Para evitar a pobreza nos transportes, o acesso a transportes públicos de qualidade a preços acessíveis, como alternativa sustentável aos meios de transporte individual, é fundamental. Isto assume especial importância nas zonas rurais e, em particular nessas zonas, os serviços de transporte partilhado e a pedido podem complementar a oferta de transportes públicos, desde que proporcionem boas condições de trabalho. Além disso, há que dar mais atenção ao transporte ativo não motorizado e às deslocações a pé e de bicicleta, e investir mais em infraestruturas seguras de qualidade.

7.4

O transporte público é importante para a inclusão social e para o emprego de qualidade a nível local. A estratégia centra-se demasiado nos aspetos tecnológicos da digitalização, na micromobilidade e nos novos serviços de mobilidade. A nova visão não deve perder de vista o facto de que a mobilidade inteligente deve ser um instrumento e não um objetivo.

Bruxelas, 27 de abril de 2021.

A Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Christa SCHWENG


(1)  Documento de trabalho dos serviços da Comissão, SWD(2020) 331, secção 4.1.1, p. 81 e ss.

(2)  Este apelo foi expresso pelos parceiros sociais europeus aos comissários Adina Vălean e Nicolas Schmit.

(3)  A convenção coletiva de trabalho (CCT) celebrada em 2019 entre a EUROGATE e o sindicato dos serviços alemão (ver.di) abrange todas as filiais alemãs do grupo, incluindo os terminais de contentores, a empresa de manutenção e ferroviária e outras unidades de negócio na Alemanha. Uma comissão de automatização estabelecida é informada sobre quaisquer projetos de hardware ou de software da empresa mesmo que estes não tenham impacto direto nos postos de trabalho. A exclusão de uma reestruturação laboral relacionada com este aspeto até 2025 é uma das cláusulas da CCT celebrada com a EUROGATE.

(4)  «Digital Transformation and Social Dialogue in Urban Public Transport (UPT) in Europe — Joint Recommendations of the European Social Partners in UPT (ETF and UITP)» [A transformação digital e o diálogo social nos transportes públicos urbanos na Europa — Recomendações conjuntas dos parceiros sociais europeus envolvidos nos transportes públicos urbanos (Federação Europeia dos Trabalhadores dos Transportes — ETF e União Internacional dos Transportes Públicos — UITP)], documento assinado em março de 2021.

(5)  JO L 102 de 11.4.2006, p. 1.


ANEXO

As seguintes propostas de alteração foram rejeitadas durante o debate, tendo recolhido, contudo, pelo menos um quarto dos sufrágios expressos:

Ponto 4.14 (em relação com a supressão do ponto 1.15)

Suprimir.

 

Os auxílios estatais são importantes para promover objetivos políticos, tais como a ecologização e a promoção da dimensão social dos transportes. O CESE considera que é urgente rever as orientações relativas aos auxílios estatais. Os aspetos territoriais, por exemplo em relação às regiões remotas, são um dos elementos que necessitam de ser revistos. Além disso, chama a atenção para o facto de que a revisão das orientações relativas aos auxílios estatais para o transporte marítimo a fim de assegurar condições sociais e económicas justas no setor portuário e o emprego dos marítimos europeus é um pedido que não é de agora e que urge satisfazer para tornar o setor do transporte marítimo socialmente sustentável, tal como o apelo a uma ação mais célere, antes de 2023.

Resultado da votação

Votos a favor:

77

Votos contra:

123

Abstenções:

27

Ponto 1.15 (em relação com a supressão do ponto 4.14)

Suprimir.

 

Os auxílios estatais são importantes para promover objetivos políticos, tais como a ecologização e a promoção da dimensão social dos transportes. O CESE considera que é urgente rever as orientações relativas aos auxílios estatais, em particular as orientações relativas aos auxílios estatais no domínio do transporte marítimo, a fim de assegurar condições sociais e económicas justas no setor portuário e o emprego dos marítimos europeus.

Resultado da votação

A alteração foi rejeitada em virtude da votação do ponto 4.14, a que estava associada.


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