Lygia Maria

Mestre em Jornalismo pela Universidade Federal de Santa Catarina e doutora em Comunicação e Semiótica pela PUC-SP.

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Descrição de chapéu Folhajus internet

STF escreve distopia no caso do Marco Civil

Ao minar presunção de inocência e propor órgão que centraliza poderes, votos de Fux e Toffoli criam futuro sombrio para a Internet no Brasil

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No conto de ficção científica "Minority Report", de Philip K. Dick, infratores são presos antes de cometerem infrações.

Nessa sociedade distópica, três pessoas que visualizam delitos antes que aconteçam, os "precogs", são conectadas a um computador que gera as imagens das previsões para os investigadores do departamento "Pré-crime".

Publicada em 1956, durante a Guerra Fria e o Macarthismo, a obra reflete preocupações de Dick com o avanço do autoritarismo sobre liberdades individuais.

Aplicativos de redes sociais em telefone celular - Dado Ruvic - 13.jul.21/Reuters

Pelo visto, os ministros do STF aqui no Brasil não leram o conto, ou, se leram, não entenderam, porque antecipar punições a possíveis infratores, de certa forma, é o que pretendem fazer —considerando os votos no julgamento em curso sobre o artigo 19 do Marco Civil da Internet. E o que se avizinha é um futuro sombrio.

Segundo o ministro Luiz Fux, conteúdos que possam ser caracterizados como injúria, calúnia e difamação devem ser retirados do ar pelas plataformas assim que recebam notificação do ofendido, sem necessidade de decisão judicial que comprove o delito. "Notificou, tira. Quer botar de novo? Judicializa", disse.

E foi além. Em casos de discurso de ódio, apologia à abolição do Estado democrático de Direito e ao golpe de Estado, as plataformas devem apagar as postagens mesmo sem notificação.


Num só voto, Fux solapa pilares do Estado de Direito: inverte o ônus da prova, põe em risco a presunção de inocência e a liberdade de expressão e incentiva abusos do poder de polícia.

Antes, o ministro Dias Toffoli já havia cometido disparate similar em seu voto, e ainda ampliou a distopia totalitária ao propor a criação do Departamento de Acompanhamento da Internet no Brasil que, em colaboração com o STF, o TSE e o Conselho Nacional de Justiça, seria responsável por monitorar a obediência das plataformas.

Não é centralizando poderes persecutórios e facilitando a censura dos cidadãos que o STF contribuirá para atualizar a regulação do ambiente online. Nenhuma democracia liberal desenvolvida no mundo agiu assim.

Se continuar nessa toada, a legislação brasileira acabará na prateleira de ficção científica.

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