Um brasileiro caminha por uma estrada de terra e se vê diante de uma bifurcação.
O caminho à esquerda traz uma placa com "A partir deste ponto, a estrada é administrada por uma empresa estatal".
O brasileiro traumatizado lembra das indicações políticas aos cargos de diretoria, das falcatruas e da ineficiência. E percebe que a estrada continua de terra, mas o mato cresce descontrolado nas laterais.
Olha à direita e sorri com a placa "Trecho administrado pelo Consórcio Estradas S.A.".
O sorriso se desfaz quando o brasileiro traumatizado lembra dos rompimentos de barragem da Vale, das fraudes nas Lojas Americanas e, assustado, recorda que serviços de ônibus e trem do Rio de Janeiro são administrados pela iniciativa privada. E percebe que a estrada é asfaltada, mas com pedágio.
O brasileiro havia gastado todo o seu dinheiro em impostos, não sobrara nem um tostão para o pedágio. Pegou a estrada pública e, alguns quilômetros depois, o caminho se dividiu em três: executivo, legislativo e judiciário.
O brasileiro traumatizado lembrou do mensalão, petrolão e do orçamento secreto. Olhou simpático para o caminho do judiciário: a estrada era ampla, forrada de mármore e iluminada por holofotes.
Havia placas em cinco idiomas, mas elas mudavam de posição ao sabor do vento. O que era "vire à esquerda a 50 metros" virava "siga em frente", conforme o relator. As estradas eram lindas e reluzentes. Mas pareciam ter vida própria. O brasileiro passou 25 anos tentando caminhar em linha reta pelas estradas do Judiciário.
Vez em quando passava um advogado carregando oito sobrenomes e um mapa. Sem acesso ao advogado, o brasileiro voltou à bifurcação inicial.
Vinte e cinco anos depois, o "Trecho administrado pelo Consórcio Estradas S.A." cobrava um pedágio 45 vezes maior. A estrada permanecia asfaltada. Mas o asfalto chinês, de péssima qualidade, lembrava terra batida. As laterais foram licenciadas para empresas que agora cobravam por serviços antes gratuitos. O xixi no mato, por exemplo, custava R$ 50.
Confuso, apertado e sem dinheiro no bolso, o brasileiro acabou fazendo xixi no chão.
Acabou preso. No camburão, deveria decidir se iria para um presídio público ou privado.
Moral da história: pouco importa o meio pelo qual o brasileiro caminha. O que importa para ele são os meios de que ele dispõe no bolso.
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