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O que a Folha pensa

O virtual destino de Tuvalu

Para enfrentar crise do clima, país na Oceania cria cópia digital de suas ilhas e até mesmo uma nova definição de Estado

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Imagem aérea de uma das ilhas do arquipélago Tuvalu, na Oceania - Kirsty Needham/Reuters

Mais de 14 mil quilômetros separam São Paulo de Tuvalu, nação insular do Pacífico. Seu nome significa "grupo de oito", alusão às ilhas originalmente habitadas, que nas próximas décadas terminarão em boa parte debaixo d’água.

As terras que emergem do atol têm no máximo 2 m de altitude. Se a comunidade internacional lograr manter o aquecimento global em 1,5ºC, o que se afigura improvável, o nível do mar no planeta subirá até 55 cm no próximo século —o bastante para tornar Tuvalu inabitável, com a perda de território e infraestrutura.

Outras dificuldades atingirão os 26 km² do país. Ressacas e tufões castigarão quem ficar. Plantar alimentos poderá tornar-se inviável, com a salinização da terra. Qualquer diminuição de chuvas, única fonte de água doce, pode colapsar o abastecimento.

Não é, por certo, o único país insular em risco. Os mesmos vagalhões baterão às praias de Tonga, Seychelles, Ilhas Marshall, para não mencionar nações portentosas como Filipinas, que tem 117 milhões de habitantes e é considerada a mais ameaçada.

Não há escapatória para os cerca de 12 mil tuvaluanos. Só para construir diques e elevar edificações, calcula-se que seria necessário US$ 1 bilhão, algo em torno de 20 vezes o PIB do arquipélago.

Opções mais radicais de sobrevivência estão sob exame, como realocar toda a população em outro país da Oceania, como Nova Zelândia ou Austrália.

Outra medida vai ainda mais longe, para o metaverso: criar uma nação virtual. A fim de manter o vínculo de seus cidadãos com o território, onde quer que estejam, o governo passou a digitalizar toda a paisagem loca.

Demais povos sem território já sobreviveram, no passado, mantendo unidade só no domínio da cultura. Tuvalu, ao que se prenuncia, será pioneiro em preservar a terra comum de sua história por meio de uma cópia digital.

A iniciativa inclui ainda a questão da soberania. Em 2023, a nação mudou o conceito de Estado na sua Constituição, indicando que ele "permanecerá perpetuamente no futuro", mesmo após perda do território físico. Outros países insulares apoiam essa redefinição. Na legislação internacional, entretanto, um Estado consiste de um território definido com população permanente.

Na prática, a crise existencial tuvaluana evidencia que, a tantas populações pobres do globo, falta um compromisso real de nações desenvolvidas com o financiamento da adaptação à crise do clima, coisa que não se viu na COP29 de Baku e dificilmente sobrevirá na COP30 de Belém.

editoriais@grupofolha.com.br

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