Descrição de chapéu Meta Facebook

Anúncio da Meta indica embate contra regulação e mudança sobre conteúdos políticos e minorias

Com discurso alinhado à extrema direita, dono da big tech diz que removerá detecção de violações de 'baixa gravidade'

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

São Paulo

Além do fim da parceria com checadores de fatos, o anúncio realizado nesta terça-feira (7) pelo CEO da Meta, Mark Zuckerberg, indica que a empresa atuará de modo mais veemente contra iniciativas de regulação das plataformas globalmente.

O dono da Meta (que detém Instagram, Facebook, Threads e WhatsApp) diz que trabalhará com o presidente eleito dos Estados Unidos, Donald Trump, "para resistir a governos ao redor do mundo que estão perseguindo empresas americanas e pressionando por mais censura".

O empresário citou a Europa e "tribunais da América Latina", no que foi lido como uma referência ao STF (Supremo Tribunal Federal), onde há iniciativas para ampliar obrigações das empresas.

Mark Zuckerberg, CEO da Meta, anuncia mudanças na política de checagem de fatos - Brendan Smialowski - 31.jan.2024/AFP

Além de ter determinado uma série de ordens de remoção de conteúdo e de perfis nos últimos anos, a corte brasileira começou a julgar em novembro do ano passado duas ações que podem aumentar a responsabilidade das plataformas.

Até o momento, três ministros votaram, apresentando teses que, se aprovadas, na prática implementariam uma regulação das redes no Brasil.

A atuação do tribunal se dá após empacarem no Congresso tentativas de aumentar os deveres da plataformas no Brasil, como no chamado PL das Fake News. Sob lobby das empresas e resistência de políticos bolsonaristas, que buscaram colar à proposta a pecha de censura, o projeto não avançou.

No anúncio desta terça, a Meta anunciou ainda que voltará a recomendar conteúdos políticos, cuja circulação tinha sido reduzida por iniciativa própria nos últimos anos.

Zuckerberg argumenta que, antes, havia um apelo público para "ver menos conteúdo político", mas que "parece que estamos entrando em uma nova era", em que a empresa está "começando a receber feedback de que as pessoas querem ver esse conteúdo novamente".

Ele afirmou também que a Meta diminuirá restrições a temas como "imigração e gênero", embora não tenha ficado claro qual será a abrangência das mudanças de política de conteúdo. Disse ainda que deixarão de ser usados filtros para detecção automatizada de conteúdo nocivo com "violações de baixa gravidade". A análise nesses casos passará a depender de denúncias de usuários.

Zuckerberg resume a medida como uma troca. "Vamos detectar menos conteúdos problemáticos, mas também reduziremos o número de postagens e contas de pessoas inocentes que removemos acidentalmente", diz.

Apesar de haver de fato uma série de relatos de erros das plataformas, por retirada de conteúdo de modo inadequado, há também críticas de que muito conteúdo nocivo fica online, inclusive após denúncias de usuários.

O anúncio indica que quem vê inação das empresas na remoção de conteúdo deve ganhar ainda mais argumentos.

Isso porque, diante do volume de material postado todos os dias, o uso de detecção automatizada seria essencial para moderação efetiva —o que, segundo Zuckerberg, permaneceria para "violações ilegais e de alta gravidade".

Ancorando a defesa dessas novidades na suposta defesa da liberdade de expressão, Zuckerberg usou diferentes argumentos e termos alinhados ao discurso de líderes da extrema direita.

Quanto ao fim das parcerias com checadores, Zuckerberg disse ainda que começará a usar modelo semelhante ao usado pelo X (antigo Twitter), chamado Community Notes, e que foi implementado por Elon Musk —grande doador de Trump e que participará da gestão do republicano.

Líder de pesquisa em tecnologia, poder e inovação no Weizenbaum Institute, na Alemanha, Clara Iglesias Keller avalia que o anúncio demonstra a necessidade de políticas públicas que estabeleçam balizas para a atuação das plataformas.

"Esse anúncio é mais uma prova de que a gente tem uma esfera pública em grande extensão digitalizada em que a circulação de conteúdo fica a critério exclusivo de empresas globais muito poderosas"

"Não existe mecanismo de participação democrática propriamente dito nesses processos", diz. "São decisões unilaterais da plataforma", declara, acrescentando ver mais uma atuação por inspiração ideológica com interesses comerciais do que uma reação a um clamor popular.

Para Francisco Brito Cruz, diretor do Internet Lab, o anúncio coloca a Meta em maior rota de colisão com uma série de atores no plano geopolítico internacional e mostra ainda um reposicionamento contra a regulação de conteúdo, saindo de uma postura de maior cooperação.

"Isso culmina numa mudança nessa aposta de colaboração, de pelo menos dizer que está querendo trabalhar, [que] só não concorda com o que está sendo proposto, mas concorda que vale a pena alguma coisa ser proposta", diz.

"Ainda existia um verniz —que, em alguns casos, era um esforço de relações públicas e, em outros, eram ações mais concretas. Acho que o que esse movimento coloca é que esse verniz não vai mais existir."

Ele também vê como irresponsável a menção, ainda que indireta, ao STF, sem nuances ou desconsiderando, por exemplo, ações de agências de inteligência dos EUA.

Na declaração, Zuckerberg criticou "países da América Latina" que "têm tribunais secretos que podem ordenar que empresas removam conteúdos de forma silenciosa".

Entenda dimensões políticas em anúncio da Meta

Fim de checagem de fatos
A Meta, controladora do Facebook e Instagram, anunciou nesta terça-feira (7) o fim de seu programa de checagem de fatos; agora, serão os usuários que incluirão correções e observações a postagens que possam conter informações falsas, à semelhança do que ocorre no X (ex-Twitter), de Elon Musk

Parceria com Trump e crítica a 'decisões secretas'
A decisão foi anunciada pelo CEO da empresa, Mark Zuckerberg, afirmando que "países da América Latina têm tribunais secretos que podem ordenar que empresas removam conteúdos de forma silenciosa" e pedindo ao presidente eleito dos Estados Unidos, Donald Trump, que ajude a combater estas decisões

Referência ao STF
A afirmação de Zuckerberg citando cortes da América Latina foi lida como uma referência ao STF (Supremo Tribunal Federal), onde está em julgamento artigo do Marco Civil da Internet que trata da responsabilidade das empresas que controlam as redes pelo conteúdo de terceiros

Embate com Suprema Corte brasileira
A empresa trava embate com o Supremo envolvendo o julgamento do Marco Civil; foi divulgada nota em que a companhia critica as propostas colocadas no julgamento, em torno da responsabilidade das empresas, e defendeu que se chegasse a uma "solução balanceada" e com "diretrizes claras"

'Maior colaboradora'
A Meta chegou a ser chamada de "uma das maiores colaboradoras da Justiça Eleitoral" no Brasil pelo ministro Alexandre de Moraes; a fala ocorreu enquanto o magistrado estava envolvido em um conflito com Musk sobre o descumprimento de decisões no X

Menos regulação global
A decisão de encerrar a checagem de fatos e a fala de Zuckerberg indicam que a empresa atuará de modo mais veemente contra iniciativas de regulação das plataformas globalmente

Nova realidade nos EUA
Ancorando a defesa dessas novidades na suposta defesa da liberdade de expressão, Zuckerberg usou diferentes argumentos e termos alinhados a líderes da extrema direita; o discurso é visto como gesto a Trump, que inclusive atribuiu a eliminação da checagem às suas ameaças; o movimento de alinhamento ao republicano ocorre em outras empresas americanas

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.