Gestão das fronteiras externas

A política de gestão das fronteiras teve de se adaptar a acontecimentos importantes, como a chegada sem precedentes de refugiados e migrantes irregulares. Acresce que, desde meados de 2015, foram identificadas várias lacunas nas políticas da UE sobre fronteiras externas e migração. Os desafios associados ao aumento dos fluxos migratórios mistos para a UE, a pandemia de COVID-19 e o aumento das preocupações com a segurança desencadearam um novo período de atividade no que diz respeito à proteção das fronteiras externas da UE, que também tem repercussões nas suas fronteiras internas.

Base jurídica

Artigo 3.º, n.º 2, do Tratado da União Europeia (TUE).

Artigos 67.º e 77.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE).

Objetivos

Um espaço único sem controlos nas fronteiras internas – o espaço Schengen – exige igualmente uma política comum de gestão das fronteiras externas. O artigo 3.º, n.º 2, do TUE solicita «medidas adequadas em matéria de controlos na fronteira externa». Por conseguinte, a UE pretende estabelecer normas comuns para os controlos nas suas fronteiras externas e aplicar gradualmente um sistema integrado para a respetiva gestão.

Realizações

O primeiro passo rumo a uma política comum de gestão das fronteiras externas foi dado em 14 de junho de 1985, quando cinco dos 10 Estados-Membros da Comunidade Económica Europeia assinaram, perto da cidade fronteiriça luxemburguesa de Schengen, um tratado internacional – denominado Acordo de Schengen –, o qual viria a ser completado, cinco anos mais tarde, pela Convenção de Aplicação do Acordo de Schengen[1]. O espaço Schengen, espaço sem fronteiras criado pelo acervo de Schengen (como são conhecidos os acordos e as regras no seu conjunto), é atualmente composto por 27 países europeus[2].

A. O acervo de Schengen aplicável às fronteiras externas

O atual acervo de Schengen aplicável às fronteiras externas baseia-se no acervo original incorporado na ordem jurídica da UE pelo Tratado de Amesterdão (ver ficha 1.1.3). As suas normas refletem-se num amplo conjunto de medidas, que podem ser divididas, grosso modo, em cinco áreas temáticas:

1. Código das Fronteiras Schengen

O Código das Fronteiras Schengen[3] é o principal pilar da gestão das fronteiras externas. Estabelece as regras sobre a passagem das fronteiras externas e as condições que regem a reintrodução temporária de controlos nas fronteiras internas. Obriga os Estados-Membros a controlar sistematicamente por confronto com as bases de dados pertinentes todas as pessoas, mesmo as que gozem do direito de livre circulação nos termos da legislação da UE (isto é, os cidadãos da UE e os seus familiares que não tenham cidadania da União), quando atravessem as fronteiras externas. As bases de dados utilizadas para a realização dos controlos incluem o Sistema de Informação de Schengen (SIS) e a base de dados da Interpol relativa aos documentos de viagem roubados e extraviados. Estas obrigações aplicam-se a todas as fronteiras externas (aéreas, marítimas e terrestres), tanto à entrada como à saída. O mecanismo de avaliação Schengen, o Regulamento (UE) n.º 1053/2013 do Conselho[4], entrou em vigor em novembro de 2014 e estabeleceu um programa de avaliação plurianual de cinco anos para o período que terminou em 31 de dezembro de 2019. O propósito do mecanismo era examinar todas as componentes do acervo de Schengen, designadamente através da análise e avaliação da forma como os Estados-Membros efetuavam os controlos nas fronteiras externas e executavam a legislação e operações pertinentes. O mecanismo prestava especial atenção ao respeito dos direitos fundamentais. As avaliações podiam também abranger medidas relacionadas com as fronteiras externas, a política de vistos, a cooperação policial e judiciária (em matéria penal), o SIS e a proteção de dados.

2. Sistema de Informação Schengen (SIS)

O SIS é um sistema de partilha de informações e base de dados que ajuda a assegurar a segurança internacional no espaço Schengen, onde não existem controlos nas fronteiras internas. Trata-se do sistema informático mais utilizado e mais eficiente da UE no seu espaço de liberdade, segurança e justiça (ELSJ) (ver ficha 4.2.1). As autoridades de toda a UE utilizam o SIS para introduzir ou consultar indicações sobre pessoas e objetos procurados ou desaparecidos. O sistema contém mais de 80 milhões de indicações e, em 2017, as autoridades consultaram-no mais de cinco mil milhões de vezes, o que provocou mais de 240 000 correspondências positivas com indicações provenientes do estrangeiro (indicações inseridas por outro país). O SIS foi recentemente reforçado através de regras atualizadas que irão corrigir possíveis lacunas no sistema e prever várias alterações fundamentais dos tipos de indicações introduzidas.

Após a reforma mais recente, em 2018, o âmbito de aplicação do SIS está agora definido em três instrumentos jurídicos, que assumem a forma de três regulamentos distintos (em substituição do SIS II):

  • cooperação policial e judiciária em matéria penal[5],
  • controlos de fronteira[6],
  • regresso dos nacionais de países terceiros em situação irregular[7].

Estes três regulamentos criam categorias de indicações no sistema, tais como indicações relativas a pessoas ou suspeitos procurados desconhecidos, indicações preventivas para as crianças que correm risco de rapto parental, indicações para efeitos de regresso e uma indicação referente a decisões de regresso emitidas relativamente a nacionais de países terceiros em situação irregular.

3. Fundo para a Segurança Interna: Fronteiras e Vistos

Nem todos os Estados-Membros da UE têm fronteiras externas e nem todos são afetados da mesma forma pelos fluxos transfronteiriços. Como tal, a UE atribui fundos de forma a tentar compensar alguns dos custos suportados pelos Estados-Membros cujas fronteiras coincidem com as fronteiras externas da UE. Este mecanismo de repartição dos encargos foi criado com um financiamento total de 3,8 mil milhões de EUR para o período de programação financeira de sete anos entre 2014 e 2020. O fundo tem como principal objetivo contribuir para assegurar um elevado nível de segurança na União e, simultaneamente, facilitar as viagens legítimas. Os beneficiários dos programas executados ao abrigo deste fundo podem ser autoridades estatais e federais, organismos públicos locais, organizações não governamentais, organizações humanitárias, empresas públicas e privadas e organizações de educação e investigação.

4. Sistema de Entrada/Saída (SES)

O Sistema de Entrada/Saída (SES)[8] é um sistema de informação que acelera e reforça os controlos de fronteira dos nacionais de países terceiros que viajam para a UE. O SES substitui a aposição manual de carimbos nos passaportes na fronteira pelo registo eletrónico na base de dados.

Os principais objetivos do SES são os seguintes:

  • reduzir o tempo necessário para os controlos nas fronteiras e melhorar a qualidade desses controlos através do cálculo automático da estada autorizada de cada viajante,
  • assegurar a identificação sistemática e fiável das pessoas que ultrapassam o período de estada autorizada,
  • reforçar a segurança interna e auxiliar no combate ao terrorismo, dando às autoridades de aplicação da lei acesso aos registos do historial das viagens.

O acesso ao SES é concedido às autoridades nacionais competentes para a aplicação da lei e à Europol, mas não às autoridades competentes em matéria de asilo. A possibilidade de transferência de dados para efeitos de aplicação da lei ou de regresso a países terceiros e Estados-Membros da UE que não participam no SES está prevista, mas apenas em determinadas condições. O SES regista os dados dos viajantes (nome, tipo de documento de viagem, impressões digitais, imagem visual, e a data e o local de entrada e saída) aquando da passagem das fronteiras externas de Schengen. Será utilizado para todos os nacionais de países terceiros, tanto os que necessitem de visto como os que estejam isentos. Será igualmente utilizado por autoridades consulares e de fronteira.

5. Agência Europeia da Guarda de Fronteiras e Costeira (Frontex)

A Guarda Europeia de Fronteiras e Costeira (GEFC) é constituída pela Agência Europeia da Guarda de Fronteiras e Costeira (Frontex) e pelas autoridades nacionais[9].

A GEFC começou a funcionar em outubro de 2016. Esta agência descentralizada tem como atribuições monitorizar as fronteiras externas da UE e, em conjunto com os Estados-Membros, identificar e responder rapidamente a potenciais ameaças à segurança das fronteiras externas da UE. Durante alguns anos, antes de 2015, o Parlamento preconizou o reforço do papel da Frontex, de modo a aumentar a sua capacidade para responder de forma mais eficaz à evolução dos fluxos migratórios. Por exemplo, na sua Resolução, de 2 de abril de 2014, sobre a revisão intercalar do Programa de Estocolmo[10], o Parlamento solicitou o recurso a guardas fronteiriços europeus para a proteção das fronteiras do espaço Schengen. Nas suas conclusões de outubro de 2015, o Conselho Europeu manifestou igualmente o seu apoio à «introdução gradual de um sistema integrado de gestão das fronteiras externas». O Parlamento insistiu em que os novos poderes de intervenção da agência fossem ativados por uma decisão dos Estados-Membros no Conselho e não por uma decisão da Comissão, como inicialmente proposto. O regulamento alarga o âmbito das atividades da Frontex, a fim de incluir um maior apoio aos Estados-Membros no domínio da gestão da migração, do combate à criminalidade transfronteiriça e das operações de busca e salvamento. Prevê também um papel mais importante para a Frontex no regresso dos migrantes aos seus países de origem, em conformidade com decisões tomadas pelas autoridades nacionais. Com base numa proposta da Comissão, o Conselho pode solicitar à Agência que intervenha e preste assistência aos Estados-Membros em circunstâncias excecionais. É este o caso, nomeadamente, quando:

  • um Estado-Membro não cumpre (num determinado prazo) uma decisão vinculativa do conselho de administração da Agência de fazer face a vulnerabilidades ao nível da sua gestão de fronteiras, e
  • existem pressões específicas e desproporcionadas sobre a fronteira externa que põem em risco o funcionamento do espaço Schengen. Se um Estado-Membro se opuser a uma decisão do Conselho com vista à prestação de assistência, os outros Estados-Membros podem restabelecer temporariamente os controlos nas fronteiras internas.

Em novembro de 2019, a Agência foi reforçada com um novo mandato e dotada dos seus próprios meios e competências para proteger as fronteiras externas, efetuar os regressos de forma mais eficaz e cooperar com países terceiros. A pedra angular desta Agência reforçada será um corpo permanente de 10 000 guardas de fronteira com poderes executivos, preparados para apoiar os Estados-Membros em qualquer momento. Terá também um mandato mais sólido no que se refere aos regressos e cooperará mais estreitamente com os países terceiros, designadamente aqueles que estão para além da vizinhança mais próxima da UE. O novo corpo permanente da Guarda Europeia de Fronteiras e Costeira tornou-se plenamente operacional em 2021 e atingirá a sua plena capacidade de 10 000 guardas de fronteira até 2024.

B. Evolução da gestão das fronteiras externas pela UE

O ritmo da mudança acelerou devido ao elevado número de perdas de vidas registado no Mediterrâneo nos últimos anos e à grande dimensão do afluxo de refugiados e migrantes desde setembro de 2015.

Antes da crise dos refugiados, só três países tinham decidido construir vedações nas fronteiras externas para evitar que migrantes e refugiados entrassem nos seus territórios: Espanha (obras concluídas em 2005 e alargadas em 2009), Grécia (concluídas em 2012) e Bulgária (em resposta à Grécia, concluídas em 2014). Contrariamente ao disposto no artigo 14.º, n.º 2, do Código das Fronteiras Schengen, que prevê que «a entrada só pode ser recusada por decisão fundamentada que indique as razões precisas da recusa», um número crescente de Estados-Membros tem começado gradualmente a construir muros ou vedações nas fronteiras, com o objetivo de impedir indiscriminadamente que migrantes e requerentes de asilo entrem nos respetivos territórios nacionais. Além disso, na ausência de regras explícitas da UE sobre a construção de vedações nas fronteiras externas de Schengen, e em violação das regras de asilo, os Estados-Membros construíram igualmente barreiras nas fronteiras com países terceiros (nomeadamente com a Bielorrússia, Marrocos e a Rússia), incluindo candidatos à pré-adesão (República da Macedónia do Norte, Sérvia e Turquia). Também foram construídas vedações dentro do espaço Schengen, como a vedação entre a Áustria e a Eslovénia, ao passo que as práticas espanholas em Melilha foram objeto de avaliação por parte do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos em Estrasburgo. As atrocidades cometidas em zonas onde são construídas vedações são documentadas por organizações de defesa dos direitos humanos[11].

O projeto Migrantes Desaparecidos da Organização Internacional para as Migrações registou mais de 29 000 mortes no âmbito das viagens de migração para a Europa desde 2014.

1. Sistema Europeu de Informação e Autorização de Viagem (ETIAS)

Em setembro de 2018, foi estabelecido o Sistema Europeu de Informação e Autorização de Viagem (ETIAS).

Este sistema de informação centralizado visa recolher informações sobre os nacionais de países terceiros que não necessitam de visto para entrar no espaço Schengen e identificar eventuais riscos de segurança ou de migração irregular. A base de dados efetuará controlos prévios dos viajantes isentos de visto e recusar-lhes-á autorização de viagem caso sejam considerados um risco. A base de dados será semelhante aos sistemas já em vigor, por exemplo, nos EUA (ESTA), no Canadá e na Austrália, entre outros.

Entre as vantagens do ETIAS figuram a redução dos atrasos nas fronteiras, uma segurança interna reforçada, uma melhor prevenção da imigração ilegal e a redução dos riscos para a saúde pública. Embora o sistema efetue controlos prévios, a decisão final relativa à concessão ou à recusa de entrada, mesmo nos casos em que a pessoa tenha uma autorização de viagem válida, será tomada pelos guardas de fronteira nacionais que efetuam os controlos nas fronteiras, em conformidade com as regras do Código das Fronteiras Schengen. O ETIAS desempenha três funções principais:

  • verificar as informações disponibilizadas em linha pelos nacionais de países terceiros isentos da obrigação de visto antes da sua viagem para a UE,
  • tratar os pedidos confrontando-os com outros sistemas de informação, nomeadamente o SIS, o VIS, a base de dados da Europol, a base de dados da Interpol, o SES e a Eurodac (a base de dados dactiloscópicos da UE, que permite a comparação de conjuntos de impressões digitais de requerentes de asilo),
  • emitir autorizações de viagem nos casos em que não haja respostas positivas ou elementos que exijam uma análise mais aprofundada.

As autorizações de viagem devem ser emitidas num intervalo de apenas alguns minutos. Em junho de 2017, o Conselho decidiu cindir a proposta em dois atos jurídicos distintos[12], pelo facto de a base jurídica (Schengen) da proposta não poder abranger alterações ao Regulamento Europol. O ETIAS está a ser desenvolvido pela agência eu-LISA e estará operacional em 2025.

2. eu-LISA

Criada em 2011, a eu-LISA é responsável pela gestão operacional dos três sistemas de informação centralizados da UE: o SIS, o VIS e o Eurodac[13]. Tem como função aplicar a nova arquitetura informática no domínio da justiça e dos assuntos internos. Em novembro de 2019, procedeu-se à revisão do mandato da eu-LISA e à ampliação da capacidade da agência para contribuir para a gestão das fronteiras, a cooperação em matéria de aplicação da lei e a gestão da migração na UE.

3. Interoperabilidade entre os sistemas de informação da UE no domínio das fronteiras

A UE tem vindo a desenvolver sistemas informáticos centralizados de grande escala (SIS, VIS, Eurodac, SES e ETIAS) para a recolha, o tratamento e a partilha de informações que são vitais para a cooperação no domínio da segurança, bem como para a gestão das fronteiras externas e da migração. Desde 2019, estes sistemas de informação são interoperáveis ao nível da UE, ou seja, apresentam capacidade de intercâmbio e partilha de dados, para que as autoridades disponham de todas as informações de que necessitam, onde e quando delas necessitem. Por interoperabilidade entende-se a capacidade dos sistemas de tecnologia da informação para partilharem informações e conhecimentos, de modo a evitar lacunas de informação causadas pela complexidade e pela fragmentação destes sistemas[14].

Os dois regulamentos em vigor permitem que os sistemas se complementem mutuamente, facilitam a identificação correta das pessoas e contribuem para combater a fraude de identidade. Não modificam os direitos de acesso estabelecidos na base jurídica de cada sistema de informação europeu, mas criam:

  • um portal europeu de pesquisa, que permitirá às autoridades competentes efetuar pesquisas simultaneamente em vários sistemas de informação, utilizando dados biográficos e biométricos,
  • um serviço partilhado de correspondências biométricas, que permitirá a pesquisa e a comparação de dados biométricos (impressões digitais e imagens faciais) existentes nos vários sistemas,
  • um repositório comum de dados de identificação, que incluirá os dados de identificação biográficos e biométricos de nacionais de países terceiros atualmente registados em vários sistemas de informação da UE,
  • um detetor de identidades múltiplas, que verifica se os dados de identidade biográficos da pesquisa existem noutros sistemas, a fim de permitir detetar várias identidades ligadas ao mesmo conjunto de dados biométricos.

4. A pandemia de COVID-19 em 2020

As restrições aos movimentos de pessoas a nível internacional e intra-UE tornaram-se uma das respostas políticas mais visíveis à pandemia de coronavírus desde o início de março de 2020. Vários Estados-Membros da UE encerraram o transporte internacional de passageiros e seguiram essa medida com restrições adicionais da UE às viagens internacionais que envolveram o encerramento parcial das fronteiras externas da UE e a restrição da entrada na UE oriunda de países terceiros[15], bem como restrições ao movimento de pessoas dentro da UE[16]. Em muitos casos, esta situação tinha um caráter arbitrário, ineficaz e discriminatório e constituía uma violação da legislação sobre privacidade e asilo, tal como demonstrado em estudos encomendados pelo Parlamento Europeu[17].

5. Crise na Ucrânia

Na sequência da invasão da Ucrânia pela Rússia, em fevereiro de 2022, mais de 6 milhões de pessoas foram forçadas a procurar refúgio, sobretudo nos países vizinhos[18]. A União Europeia decidiu conceder proteção temporária à escala da UE às pessoas provenientes da Ucrânia[19]. A Diretiva Proteção Temporária da UE[20] permite aos Estados-Membros da UE agir rapidamente para oferecer proteção e conceder direitos às pessoas que necessitam de proteção imediata.

O papel do Parlamento Europeu

No passado, a elaboração de uma política de gestão das fronteiras externas suscitou reações diversas no Parlamento. De modo geral, o Parlamento apoiou o reforço da função coordenadora da Frontex e das demais agências pertinentes da União, e solicitou amiúde o reforço dos respetivos papéis, visto que a UE tem de gerir a crise migratória no Mediterrâneo. Apesar de acolher de forma geralmente positiva o desenvolvimento da Frontex, o Parlamento tem-se mostrado mais cauteloso em relação às fronteiras inteligentes. Na sequência da proposta da Comissão, de 2013, o Parlamento manifestou apreensão relativamente à enorme mobilização de meios tecnológicos e ao tratamento em larga escala de dados pessoais recolhidos nas fronteiras externas. Além disso, os custos previstos das tecnologias utilizadas para as fronteiras inteligentes, associados às dúvidas em torno das suas vantagens, suscitaram no Parlamento uma série de preocupações. Na sua Resolução, de 12 de setembro de 2013, sobre o segundo relatório anual sobre a aplicação da Estratégia de Segurança Interna da UE, o Parlamento afirmou que «o possível desenvolvimento de novos sistemas de TI na área da migração e da gestão das fronteiras, como as iniciativas "Fronteiras inteligentes", deve ser cuidadosamente analisado, especialmente à luz dos princípios da necessidade e da proporcionalidade». Seguiu-se uma pergunta oral dirigida à Comissão e ao Conselho, em setembro de 2015, em que o Parlamento solicitou que tomassem posição sobre o acesso ao sistema por parte das entidades de aplicação da lei e a relevância do acórdão do Tribunal de Justiça da União Europeia de abril de 2014 sobre a Diretiva Conservação de Dados (ver ficha 4.2.8). Na sua resolução sobre o relatório anual sobre o funcionamento do espaço Schengen[21], o Parlamento instou os Estados-Membros, incluindo os que não têm fronteiras terrestres externas, a assegurarem um nível elevado de controlo nas suas fronteiras externas, prevendo, para o efeito, recursos suficientes em termos de pessoal, equipamento e conhecimentos especializados e estabelecendo as necessárias estruturas de comando e controlo para que a passagem das fronteiras seja segura, ordenada e fluida.

O Parlamento insistiu igualmente na necessidade de todas as medidas tomadas neste domínio levarem em devida conta o acervo da UE em matéria de asilo e fronteiras, bem como a Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia. Assim, o Parlamento tem vindo a solicitar, há já algum tempo, procedimentos fiáveis e justos e uma abordagem holística da migração ao nível da UE[22]. O Parlamento está ativamente empenhado no controlo da aplicação e do cumprimento do acervo de Schengen. O Grupo de Trabalho sobre o Controlo de Schengen da Comissão das Liberdades Cívicas, da Justiça e dos Assuntos Internos do Parlamento estabelece uma ligação com a Comissão Europeia e o Conselho nas fases pertinentes do processo de avaliação e monitorização, tais como o relatório final de avaliação, as recomendações adotadas e o plano de ação.

Quanto à pandemia de COVID-19, o Parlamento aprovou uma resolução em junho de 2020 sobre a situação no espaço Schengen na sequência do surto de COVID-19 em que lamentou a falta de informação recebida. Recordou também que as restrições temporárias de viagem aplicáveis a todas as viagens não essenciais de países terceiros para o espaço Schengen e as decisões relativas à recusa de entrada nas fronteiras externas devem estar em conformidade com as disposições do Código das Fronteiras Schengen[23]. Um estudo encomendado pelo Parlamento destacou que as restrições introduzidas em resposta à pandemia foram sujeitas a uma evolução constante e a mudanças rápidas, o que resultou numa profunda insegurança jurídica para os indivíduos e em repercussões negativas nos direitos e liberdades da UE[24]. Outro estudo recente aponta para a utilização extensiva de tecnologias biométricas de IA pelos Estados-Membros para efeitos de vigilância em larga escala dos migrantes[25].

Numa resolução de 1 de março de 2022, o Parlamento congratulou-se com a ativação da Diretiva Proteção Temporária pela primeira vez desde a sua entrada em vigor em 2001[26]. Em 9 de março de 2022, os deputados ao Parlamento Europeu apelaram à UE para que introduzisse um sistema de migração adequado assente na responsabilidade partilhada pelos refugiados. Em 4 de abril de 2023, a Comissão das Liberdades Cívicas, da Justiça e dos Assuntos Internos (LIBE) do Parlamento aprovou um relatório sobre a proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo à resposta a situações de crise no domínio da migração e do asilo e, em 14 de abril de 2023, aprovou um relatório sobre a proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que introduz uma triagem dos nacionais de países terceiros nas fronteiras externas, bem como um relatório sobre a proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo à gestão do asilo e da migração.

Em 10 de abril de 2024, o Parlamento debateu e aprovou 10 textos legislativos para reformar a política europeia de migração e asilo. Em 24 de abril de 2024, o Parlamento tomou posição sobre a alteração do Código das Fronteiras Schengen no intuito de reforçar a capacidade de resistência do espaço Schengen a ameaças graves e adaptar as regras de Schengen à evolução dos desafios.

Consulte a página Internet do Parlamento Europeu sobre Schengen.

 

[1]Acervo de Schengen: convenção, de 19 de junho de 1990, de aplicação do Acordo de Schengen, de 14 de junho de 1985, entre os Governos dos Estados da União Económica Benelux, da República Federal da Alemanha e da República Francesa relativo à supressão gradual dos controlos nas fronteiras comuns, JO L 239 de 22.9.2000, p. 19.
[2]Entre estes países não se incluem os Estados-Membros seguintes: Chipre, Irlanda, Bulgária e Roménia. No entanto, o espaço Schengen inclui quatro Estados que não pertencem à UE: Islândia, Suíça, Noruega e Listenstaine. A Dinamarca conta com uma cláusula de autoexclusão do Título V do TFUE (Protocolo n.º 22), mas participa numa base intergovernamental.
[3]Regulamento (UE) 2016/399 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 9 de março de 2016, que estabelece o código da União relativo ao regime de passagem de pessoas nas fronteiras (Código das Fronteiras Schengen), JO L 77 de 23.3.2016, p. 1, alterado pelo Regulamento (UE) 2017/458 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de março de 2017, que altera o Regulamento (UE) 2016/399 no que diz respeito ao reforço dos controlos nas fronteiras externas por confronto com as bases de dados pertinentes, JO L 74 de 18.3.2017, p. 1.
[4]Regulamento (UE) n.º 1053/2013 do Conselho, de 7 de outubro de 2013, que cria um mecanismo de avaliação e de monitorização para verificar a aplicação do acervo de Schengen e que revoga a Decisão do Comité Executivo de 16 de setembro de 1998 relativa à criação de uma comissão permanente de avaliação e de aplicação de Schengen, JO L 295 de 6.11.2013, p. 27.
[5]Regulamento (UE) 2018/1862 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 28 de novembro de 2018, relativo ao estabelecimento, ao funcionamento e à utilização do Sistema de Informação de Schengen (SIS) no domínio da cooperação policial e da cooperação judiciária em matéria penal, e que altera e revoga a Decisão 2007/533/JAI do Conselho e revoga o Regulamento (CE) n.º 1986/2006 do Parlamento Europeu e do Conselho e a Decisão 2010/261/UE da Comissão, JO L 312 de 7.12.2018, p. 56.
[6]Regulamento (UE) 2018/1861 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 28 de novembro de 2018, relativo ao estabelecimento, ao funcionamento e à utilização do Sistema de Informação de Schengen (SIS) no domínio dos controlos de fronteira, e que altera a Convenção de Aplicação do Acordo de Schengen e altera e revoga o Regulamento (CE) n.º 1987/2006, JO L 312 de 7.12.2018, p. 14.
[7]Regulamento (UE) 2018/1860 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 28 de novembro de 2018, relativo à utilização do Sistema de Informação de Schengen para efeitos de regresso dos nacionais de países terceiros em situação irregular, JO L 312 de 7.12.2018, p. 1.
[8]Regulamento (UE) 2017/2226 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 30 de novembro de 2017, que estabelece o Sistema de Entrada/Saída (SES) para registo dos dados das entradas e saídas e dos dados das recusas de entrada dos nacionais de países terceiros aquando da passagem das fronteiras externas dos Estados-Membros, que determina as condições de acesso ao SES para efeitos de aplicação da lei, e que altera a Convenção de Aplicação do Acordo de Schengen e os Regulamentos (CE) n.º 767/2008 e (UE) n.º 1077/2011, JO L 327, de 9.12.2017, p. 20.
[9]Regulamento (UE) 2019/1896 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de novembro de 2019, relativo à Guarda Europeia de Fronteiras e Costeira, que revoga os Regulamentos (UE) n.º 1052/2013 e (UE) 2016/1624, JO L 295 de 14.11.2019, p. 1.
[12]Regulamento (UE) 2018/1240do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de setembro de 2018, que cria um Sistema Europeu de Informação e Autorização de Viagem (ETIAS) e altera os Regulamentos (UE) n.º 1077/2011, (UE) n.º 515/2014, (UE) 2016/399, (UE) 2016/1624 e (UE) 2017/2226, JO L 236 de 19.9.2018, p. 1, e o Regulamento (UE) 2018/1241 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de setembro de 2018, que altera o Regulamento (UE) 2016/794 para efeitos da criação de um Sistema Europeu de Informação e Autorização de Viagem (ETIAS), JO L 236 de 19.9.2018, p. 72.
[13]Regulamento (UE) 2018/1726 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 14 de novembro de 2018, relativo à Agência da União Europeia para a Gestão Operacional de Sistemas Informáticos de Grande Escala no Espaço de Liberdade, Segurança e Justiça (eu-LISA), que altera o Regulamento (CE) n.º 1987/2006 e a Decisão 2007/533/JAI do Conselho, e que revoga o Regulamento (UE) n.º 1077/2011, JO L 295 de 21.11.2018, p. 99.
[14]Regulamento (UE) 2019/817 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de maio de 2019, relativo à criação de um regime de interoperabilidade entre os sistemas de informação da UE no domínio das fronteiras e vistos e que altera os Regulamentos (CE) n.º 767/2008, (UE) 2016/399, (UE) 2017/2226, (UE) 2018/1240, (UE) 2018/1726 e (UE) 2018/1861 do Parlamento Europeu e do Conselho, e as Decisões 2004/512/CE e 2008/633/JAI do Conselho, JO L 135 de 22.5.2019, p. 27, e o Regulamento (UE) 2019/818 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de maio de 2019, relativo à criação de um regime de interoperabilidade entre os sistemas de informação da UE no domínio da cooperação policial e judiciária, asilo e migração, e que altera os Regulamentos (UE) 2018/1726, (UE) 2018/1862 e (UE) 2019/816, JO L 135 de 22.5.2019, p. 85.
[15]Ver a Declaração comum dos membros do Conselho Europeu, Bruxelas, 26 de março de 2020.
[16]Tell Cremades, M., Studies with a ‘Covid 19 angle’ [Estudos sob o ângulo da COVID-19], Direção-Geral das Políticas Internas do Parlamento Europeu, Departamento Temático dos Direitos dos Cidadãos e dos Assuntos Constitucionais, Parlamento Europeu, junho de 2021.
[17]Carrera S. et al, In the Name of COVID-19: An Assessment of the Schengen Internal Border Controls and Travel Restrictions in the EU [Em nome da COVID-19: uma avaliação dos controlos nas fronteiras internas de Schengen e das restrições de viagem na UE], Direção-Geral das Políticas Internas do Parlamento Europeu, Departamento Temático dos Direitos dos Cidadãos e dos Assuntos Constitucionais, Parlamento Europeu, setembro de 2020.
[19]Decisão de Execução (UE) 2022/382 do Conselho de 4 de março de 2022 que declara a existência de um afluxo maciço de pessoas deslocadas da Ucrânia na aceção do artigo 5.º da Diretiva 2001/55/CE, e que tem por efeito aplicar uma proteção temporária.
[20]Diretiva 2001/55/CE do Conselho, de 20 de julho de 2001, relativa a normas mínimas em matéria de concessão de proteção temporária no caso de afluxo maciço de pessoas deslocadas e a medidas tendentes a assegurar uma repartição equilibrada do esforço assumido pelos Estados-Membros ao acolherem estas pessoas e suportarem as consequências decorrentes desse acolhimento, JO L 212 de 7.8.2001, p. 12.
[21]Resolução do Parlamento Europeu, de 30 de maio de 2018, sobre o relatório anual sobre o funcionamento do espaço Schengen, JO C 76 de 9.3.2020, p. 106.
[22]Resolução do Parlamento Europeu, de 12 de abril de 2016, sobre a situação no Mediterrâneo e a necessidade de uma abordagem holística da UE em relação à migração, JO C 58 de 15.2.2018, p. 9.
[23]Resolução do Parlamento Europeu, de 19 de junho de 2020, sobre a situação no espaço Schengen na sequência do surto de COVID-19, JO C 362 de 8.9.2021, p. 77.
[24]Carrera S., Chun Luk, N., In the Name of COVID-19: An Assessment of the Schengen Internal Border Controls and Travel Restrictions in the EU [Em nome da COVID-19: uma avaliação dos controlos nas fronteiras internas de Schengen e das restrições de viagem na UE], Direção-Geral das Políticas Internas do Parlamento Europeu, Departamento Temático dos Direitos dos Cidadãos e dos Assuntos Constitucionais, setembro de 2020.
[25]Wendehorst, C., Duller, Y., Biometric Recognition and Behavioural Detection [Biometria e deteção de comportamentos], Direção-Geral das Políticas Internas do Parlamento Europeu, Departamento Temático dos Direitos dos Cidadãos e dos Assuntos Constitucionais, agosto de 2021.
[26]Resolução do Parlamento Europeu, de 1 de março de 2022, sobre a agressão russa contra a Ucrânia, JO C 125 de 18.3.2022, p. 2.

Pablo Abril Marti / Mariusz Maciejewski